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Desvendando os segredos dos anéis do pistão que resultam em desempenho do motor e economia


Motor queimando óleo e fumaça saindo pelo escapamento podem ser sinais de defeitos nos anéis do pistão que perderam a sua principal função que é a vedação, fazendo o motor perder compressão e eficiência

Por: Paulo José de Sousa - 02 de agosto de 2017

Fig. 1: Pistão e jogo de anéis

A importância do jogo de anéis do pistão vai muito além do que pensamos, a potência do motor e as emissões de gases de escapamento dependem diretamente da atuação e desempenho dos anéis. Nesta matéria vamos trazer detalhes da construção do conjunto e também iremos nos aprofundar um pouco mais no assunto.

Montar o jogo de anéis no pistão é até simples, mas o entendimento do princípio da vedação é um pré-requisito para a eficácia no diagnóstico de motores, pois a análise exige dedicação e muita atenção aos detalhes de construção dos anéis, paredes do cilindro e canaletas do pistão, porém nem sempre conseguimos observar isso na correria do dia a dia da oficina.

O jogo de anéis suporta inúmeros esforços, pressões e temperaturas, seu trajeto do “PMI” ao “PMS” (ponto morto inferior ao ponto morto superior) e vice-versa é realizado em ritmo acelerado, já comentamos em matérias anteriores que a velocidade média do pistão de uma motocicleta 125cc a 10000 RPM está próxima dos 65km/h, portanto, como elemento de vedação o jogo de anéis tem que ser bom para aguentar o “tranco” e garantir a performance do motor.

Uma peça com toda essa responsabilidade exige em sua construção um detalhamento muito bem elaborado, basicamente os anéis têm as seguintes funções:

• Controlar o fluxo de óleo nas paredes do cilindro, sem deixar o lubrificante subir para a câmara de combustão;

• Assegurar a compressão na câmara de combustão retendo os gases para que não cheguem ao cárter;

• Dissipar (conduzir) parte do calor do pistão para o cilindro, assim o sistema de arrefecimento do motor alcança melhor controle da temperatura interna do motor.

É bom lembrar que o resultado do trabalho dos anéis também está relacionado à condição de outros itens que atuam em conjunto, ex.: cilindro, pistão e lubrificante, mas se um desses elementos falhar surgirão efeitos indesejáveis e consequentemente ocorrerá a queima de óleo do motor e também uma queda na pressão da compressão do cilindro, este último dado serve de parâmetro de diagnósticos para o reparador.

Características dos anéis

No jogo de anéis cada item possui um desenho definido para um ou mais objetivos, as partes contam com características especiais, diferentes materiais e empregam tecnologias de construção e tratamento superficial para suportarem todas as solicitações do motor. Talvez esta seja uma das justificativas do preço do kit de peças ser alto.

Descrição:

Cada anel deve ser montado na canaleta correspondente

1. Anel de compressão;

2. Anel raspador (compressão);

3. Par de anéis de óleo e mola (espaçador).

1. Anel de compressão: Requisito básico é assegurar a compressão na câmara de combustão, possui perfil especial para garantir o máximo contato com o cilindro e ter melhor vedação.

É confeccionado de material que proporciona resistência ao desgaste e à temperatura, o anel está montado na canaleta da região mais quente do pistão, o componente recebe as pressões da compressão e também da combustão junto com a temperatura excessiva.

2. Anel raspador (compressão): Popularmente é conhecido como anel raspador, visto que no movimento de descida do pistão o anel remove parte do óleo das paredes do cilindro, este anel também atua no controle da compressão junto com o primeiro anel.

O ângulo na borda de contato permite ao anel espalhar o óleo no movimento de subida e remover o excesso de lubrificante no percurso de descida do pistão.

3. Anéis de óleo: O conjunto de anéis e mola de expansão tem a finalidade de remover o lubrificante do cilindro no movimento de descida do pistão, os anéis fazem a raspagem, a mola assegura a pressão dos anéis contra o cilindro, o óleo removido pelos anéis percorre dois caminhos até chegar ao cárter: os canais internos e também as laterais da saia do pistão.

Defeitos no anel de pressão (mola) podem ser causas da queima de óleo no motor, vejamos:

• Falhas de montagem;

• Perda de pressão;

• Mola quebrada (fig.2).

Fig. 2: Anel de pressão dos anéis de óleo

Evolução dos anéis

Ao Comparar os anéis modernos com os da geração antiga, percebe-se que os atuais estão mais finos, a alteração resultou vantagens para o motor como: redução nas emissões de gases e queima de óleo do motor.

O motor de motocicleta trabalha em alta rotação, por isso a alteração de projeto foi significativa.

Em análise, com o jogo de anéis e pistão mais leve resultou em menor massa em movimento, o resultado veio na redução na inércia que ocorre quando o pistão muda de direção durante o sobe e desce dentro do cilindro.

Entendendo o efeito da inércia dos anéis como efeito nas canaletas do pistão, os anéis exercem uma pressão que após milhares de quilômetros criará uma deformação que aos poucos trará complicações, ocorrerão falhas na acomodação dos anéis na canaletas e a vedação da parte interna ficará comprometida. Os anéis também podem sofrer deformação e até quebras.

Atualmente os fabricantes desenvolvem anéis com desenho especial, os elementos de vedação se acomodam nas canaletas conforme movimentação do pistão, a vedação interna dos anéis é otimizada nas condições de subida e descida do pistão. Porém esses ângulos nem sempre são percebidos pelo reparador, o profissional ao efetuar o reparo no motor utiliza peças de reposição que nem sempre têm a mesma característica e o resultado do trabalho pode ficar abaixo da expectativa.

Falhas nas vedações internas dos anéis e as consequências ao motor - A falha na vedação dos anéis nem sempre está no contato anel e cilindro, os gases resultantes da queima do combustível também podem passar por trás dos anéis, ou seja, entre os anéis e o pistão e em seguida fluir para o cárter, da mesma forma o óleo do motor pode subir para a câmara de combustão pelo mesmo caminho.

Durante o processo de reduzida de marcha, o motor pode estar com o vácuo alto, pois normalmente o acelerador da motocicleta será fechado cortando o ar que flui para a câmara de combustão, nessa condição os gases do cárter tendem a subir mais facilmente para a câmara de combustão e queimar junto com a mistura ar/ combustível, o resultado será fumaça saindo pelo escapamento, alto consumo de óleo do motor, contaminação do catalisador, aumento nas emissões de poluentes e baixo desempenho da motocicleta.

Outro agravante será a formação de carvão nas canaletas, em um processo a curto prazo os anéis engripam (travam) e o topo do pistão bate lateralmente no cilindro, a trepidação será ouvida pelo condutor da motocicleta e também pode gerar até a quebra do pistão.

Fig. 3 -Pistão e anéis: (1) Pistão fabricado a partir do ano 2000, (2) pistão aplicado até o final da década de 1990 - motocicleta 125cm[3]

Elementos causadores de desgastes prematuros nos anéis

Falta de manutenção: O pó e a limalha do metal são grandes inimigos do anéis do pistão, o efeito da abrasão na superfície dos anéis e também do cilindro provoca desgastes excessivos.

Normalmente a ocorrência está relacionada à ausência de manutenção preventiva nos seguintes itens: intervalo de troca do lubrificante de motor, substituição de filtros de ar e de óleo.

A poeira também pode entrar no motor através de falhas nas vedações dos coletores de admissão. Em regiões onde há muito pó, ex.: estradas não pavimentadas, o reparador deve dobrar a atenção na manutenção dos filtros e troca de óleo do motor, também há abrasivos de outras naturezas, esses podem entrar no motor durante um reparo ou manutenção, ex.: raspas de juntas.

Em motores novos, a limalha de metal que acelera o desgaste dos anéis é proveniente do amaciamento, por isso, os manuais dos fabricantes recomendam que as primeiras trocas de óleo e filtro sejam realizadas em intervalos mais curtos.

Fique atento ao excesso de partículas metálicas no óleo durante a troca, pode ser resultado da quebra de peças do motor, portanto se for constatada a presença de partículas no óleo durante sua drenagem é recomendável identificar a causa e se necessário abrir o motor, do contrário ocorrerão uma sucessão danos internos.

Retífica do motor: O acabamento das paredes do cilindro conhecido como brunimento também pode acelerar o desgaste dos anéis, os excessos de rugosidade ou de polimento são prejudiciais.

No processo de retífica do motor o acabamento grosseiro das laterais do cilindro pode se transformar em uma lixa para os anéis, já o excesso de polimento, ao contrário do que parece também é proibido ao motor, o óleo não tem boa adesão em paredes muito lisas, a lubrificação será comprometida

Amaciamento do motor: As receitas populares sobre a questão do amaciamento do motor são diferentes das recomendadas nos manuais, o processo correto de amaciamento do motor consiste em seguir à risca a recomendação do fabricante da motocicleta, em resumo não se deve exceder uma determinada rotação do motor conforme a quilometragem da motocicleta, motor novo é sinônimo de pouca folga de trabalho entre os componentes internos, portanto o excesso de rotação irá acelerar o desgaste.

Biela torta: Pistão e anéis com desgastes concentrados em apenas um ponto pode significar que há excesso de esforço lateral do pistão, normalmente a causa é atribuída ao desalinhamento da biela

Falha de manuseio: Os anéis têm uma determinada elasticidade, eles foram dimensionados para exercer pressão nas laterais do cilindro, falhas de manuseio são causas de deformações e pequenas fissuras que podem evoluir para a quebra da peça.

Mistura ar/combustível: A temperatura na câmara de combustão é regulada pela mistura ar/combustível, motor desregulado atinge altas temperaturas que são capazes de derreter o pistão e danificar os anéis

Lavagem do cilindro: Outra ação devastadora aos anéis é o efeito da lavagem do cilindro, o fenômeno ocorre quando há combustível líquido fluindo para o motor através da(s) válvula(s) de admissão, o óleo das paredes do cilindro, anéis e laterais do pistão é removido (lavado), com o funcionamento do motor ocorre o desgaste precoce do conjunto de anéis, pistão e cilindro.

Ainda como consequência, o combustível em excesso acumula-se no cárter elevando o nível de óleo, consequência disso é um ligeiro aumento na pressão interna do motor, a pressão por sua vez ocasiona vazamentos no motor.

O combustível contamina o óleo e altera a viscosidade, em pouco tempo ocorre uma ação agressiva aos componentes internos do motor, inclusive aos anéis.

Diagnósticos dos anéis

Fig. 4 - Análise do cilindro

Para avaliar a condição dos anéis é necessário analisar em conjunto a geometria do pistão e cilindro:

• Folga entre pontas;

• Folga entre os anéis e as canaletas do pistão;

• Montagem.

1. Verificações das folgas entre as pontas dos anéis com auxílio de um jogo de lâminas:

Considerações: as folgas dos anéis são medidas dentro dos cilindros novos ou usados, porém dentro das tolerâncias dos fabricantes.

Em cilindros usados a recomendação é que a verificação de folga entre as pontas dos anéis seja realizada no ponto de menor diâmetro, o jogo de anéis deverá ser substituído se uma das medidas obtidas exceder a tolerância.

O contato entre o jogo de anéis e o cilindro deverá ser observado, na prática o reparador deverá correr o anéis ao longo do cilindro e observar a circularidade do jogo, ou seja, ver se não há espaço entre o anel e o cilindro, do contrário ocorrerá queima de óleo e vazamento de compressão

Anéis com folgas entre pontas inferiores ao padrão do fabricante apresentarão possibilidade de engripamento ou danos maiores ao cilindro.

Veja se os anéis correspondem à medida do pistão, ex. pistão STD (Stander) deve receber um conjunto de anéis na mesma medida, cada fabricante define quantas retíficas o motor pode receber com medidas que variam de: 0.25mm a 1,00mm

 

Verificação da radial dos anéis

 

A eficiência da vedação do motor também depende da movimentação dos anéis nas canaletas do pistão.

Os anéis podem travar dentro das canaletas, as causas mais comuns são:

• Acúmulo de carvão proveniente da queima de óleo do motor;

• Canaleta deformada;

• Anel com espessura acima da especificação;

• Anel deformado.

Verificação de folga entre os anéis e as canaletas

Antes de verificar a folga certifique-se que canaleta está limpa, os anéis devem ficar livres (soltos) nas canaletas.

Para realizar a medida primeiramente é necessário pressionar o anel até que sua superfície de contato esteja nivelada com o pistão.

Com uma lâmina verifique a folga entre o anel e a respectiva canaleta, a aferição deve ser feita no mínimo em 3 pontos entre a canaleta, para efeito de diagnóstico o reparador deve considerar o maior valor de folga obtido na medição.

Observe se há desgaste desigual, conferindo o encaixe e assentamento dos anéis, e perfeitamente paralelos às superfícies laterais. Caso alguma das medidas esteja acima do padrão substitua o jogo de anéis e o pistão.

A verificação deve ser feita nas canaletas dos anéis de compressão e raspador, para o conjunto dos anéis de óleo nem todos os fabricantes determinam um padrão de folga. O calibre de lâminas utilizado para a verificação de folgas deve variar de 0,03mm até 0,20mm.

Inspeção da largura das canaletas do pistão

Antes de iniciar a medição veja se não há trincas ou falhas de material nas laterais do pistão, com um paquímetro verifique a medida em vários pontos das canaletas.

Para efeito de diagnóstico adote o maior valor obtido nas medidas, compare com o limite padrão do fabricante do motor.

Substitua o pistão se uma das medidas for superior ao limite de uso.

 

Verificação da espessura dos anéis de compressão e raspador - Com o auxílio de um micrômetro verifique a espessura dos anéis, a medição deve ser realizada no mínimo em 3 pontos da peça.

 

Para efeito de diagnóstico adote o menor valor obtido nas medidas, compare com o limite padrão do fabricante do motor.

Substitua o jogo de anéis se uma das medidas for inferior ao limite de uso.

3. Posição dos anéis no processo de montagem no pistão

A regra básica dos fabricantes de motocicletas definidas nos manuais de serviços praticamente são as mesmas, cada anel ocupará uma canaleta específica, há uma defasagem entre eles para o posicionamento das pontas e a referência de instalação posicionada para cima, vejamos:

• Defasagem entre as pontas;

• Posição dos anéis;

• Referência de montagem.

No processo de montagem dos anéis nas canaletas do pistão, os manuais recomendam uma defasagem de 120° entre as pontas, o objetivo é evitar o alinhamento dos anéis durante o funcionamento do motor, visto que é comum o giro dentro das canaletas, o alinhamento das pontas provocará queda da compressão do motor e queima de óleo.