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Em nome da segurança do cliente, sangria do freio ABS requer total atenção do reparador


Procedimento bastante conhecido nas oficinas, a sangria do sistema de frenagem não pode ser negligenciada nem feita às pressas sob o risco de pôr em risco a vida do condutor do veículo, seus passageiros e pedestres

Por: Antônio Edson - 26 de junho de 2017

Foto 1

Na abertura da última Automec (Feira Internacional de Autopeças, Equipamentos e Serviços), realizada em São Paulo (SP), o presidente do Sindirepa (Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos e Acessórios do Estado de São Paulo), Antônio Fiola, afirmou que o automóvel não é apenas um bem, mas um instrumento que salva vidas. Segundo o dirigente, se os reparadores lembrarem aos clientes que eles transportam vidas humanas em seus veículos esses dispensarão maiores cuidados preventivos a eles.

De fato, uma maior ajuda dos reparadores seria providencial para conscientizar os motoristas do Brasil e até uma questão de saúde pública. Enquanto no Japão e Europa registram-se, respectivamente, 1,7 e 2,7 mortes por 10 mil acidentes de automóvel, aqui o índice chega a 23,4, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). E se o abuso dos motoristas e a má situação das pistas colaboram para essa tragédia a falta de manutenção dos carros também responde por uma parte significativa dela: em 2002, um estudo do engenheiro de trânsito Roberto Scaringella atribuía ao “fator veículo” 27% dos acidentes ocorridos nas estradas paulistas. “Como um avião ou helicóptero, o automóvel igualmente exige manutenção preventiva para ser seguro e evitar acidentes”, reforçou Fiola.

Freio, essencial e básico

Em um veículo muitos itens concorrem para a segurança de motoristas, passageiros e pedestres, mas talvez nenhum seja tão prioritário quanto os freios. Eles, afinal, são os primeiros a serem acionados pelo condutor quando o automóvel precisa parar ou diminuir sua marcha. Quando pisamos – quase instintivamente – naquele pedal do meio ou da esquerda, se o veículo for automático, só temos mesmo um objetivo: fazer o sistema de frenagem funcionar eficientemente. Foi por isso que os carros nacionais passaram a sair de fábrica em 2014 com o sistema ABS (Anti-lock Breaking System), que impede o travamento das rodas ao frearmos. A partir daí vieram o Programa Eletrônico de Estabilidade ou Electronic Stability Program (ESP), o Controle de Tração (CT) e até o sistema de frenagem automática pós-colisão, ou Post-Collision Braking (PCB).

Mas tantos recursos e siglas são inúteis se alguns procedimentos elementares da conservação dos veículos forem negligenciados por motoristas ou esquecidos pelos reparadores. Um deles, essencial, é a atenção ao reservatório do fluido de freio (foto 1). Afinal, esse líquido é fundamental por exercer pressão sobre pastilhas e lonas e por lubrificar o sistema de frenagem, evitando sua corrosão. Seu mau funcionamento pode, entre outras consequências, entupir a unidade hidráulica do ABS e diminuir a capacidade de frenagem, o que implica em risco de acidentes.

Perigo sob o pedal

Um típico caso envolvendo um fluido de freio vencido e disfuncional, ocorrido recentemente na oficina Interceptor Auto Reparadora, localizada no alto da Lapa, em São Paulo (SP), ilustra bem o quanto um reparador pode conscientizar um condutor e evitar desdobramentos piores. Ali, um jovem encostou seu veículo, um Corsa 2014 com cerca de 62 mil quilômetros (foto 2), para uma revisão de praxe. Essa se passou sem maiores intercorrências até se detectar que o veículo estava ainda com o seu fluido de freio original de fábrica, ou seja: nunca havia sido trocado. Resultado? “Desmontamos as rodas traseiras (foto 3), com freios a tambor, e constatamos vazamentos nos cilindros (fotos 4 e 4A). Foi necessário substituí-los por cilindros novos (fotos 5 e 5A), assim como pôr um novo fluido já que o velho apresentava acidez acima do tolerável. Um fluido com mais de 2% de acidez perde sua eficiência e desgasta as borrachas do sistema de frenagem”, alerta o reparador Éder Aparecido Preto Candiotta, (foto 6) de 36 anos e que há 19 atua no ramo, a maior parte desse tempo junto à Interceptor Auto Reparadora.

Segundo o reparador Éder Aparecido, o cliente, de fato, relatou que necessitava bombear o pedal várias vezes para obter uma frenagem razoável, mas adiou a visita a oficina para fazer uma revisão geral no veículo. “O problema é que ele, nesse ínterim, correu o risco de ficar totalmente sem freio e foi alertado desse perigo por nós. Felizmente, o susto passou e o veículo saiu da oficina reparado e totalmente seguro. E certamente o condutor agora será mais cauteloso no futuro. Não deixará vencer a validade do fluido de freio que tem um prazo máximo que varia entre 15 mil e 20 mil quilômetros”, relatou o Consultor OB desta edição.

 

Classificação do DOT

 

De acordo com o reparador, a troca do fluido do freio varia conforme a composição química desse produto, mas nunca deve ultrapassar a marca dos 20 mil quilômetros. Esses fluidos são classificados de acordo com um padrão internacional denominado DOT, acrônimo de “Department Of Transportation” dos Estados Unidos, entidade que primeiro os classificou. Essa medida DOT indica o ponto de ebulição do líquido. Quanto mais alto ela for maior será o ponto de ebulição do fluido e, consequentemente, a sua eficiência. “Mas é preciso ficar atento, pois fluidos com maior DOT também tendem a durar menos”, alerta o reparador Éder.

Normalmente, os fluidos disponíveis no Brasil são os do DOT 3, com ponto de ebulição mínima a 205ºC e que são os mais utilizados em automóveis de passeio e veículos leves; os do DOT 4, com ponto de ebulição mínima a 230ºC já começam a sair em alguns veículos novos por serem mais seguros e terem uma ebulição mais alta. Já os DOT 5, com ebulição mínima a 260ºC, são mais utilizados em veículos de alta performance, como utilitários esportivos e veículos de competição.

Sangria e troca de cilindros

A substituição do fluido se dá através do clássico procedimento da sangria do sistema de frenagem. Apesar de bem conhecido por 10 entre 10 bons reparadores trata-se de uma conduta que não pode ser feita às pressas nem de forma descuidada, sob o risco de alguma falha expor ao perigo a segurança do condutor do veículo, seus passageiros e pedestres. “Com quase todos os carros agora providos de ABS é preciso tomar um cuidado extra ao fazer o procedimento. Esse deve ser realizado com a chave na ignição ligada. Assim, ao pisar no freio, durante o procedimento da sangria, as válvulas abrem e fecham e não formam bolhas de ar dentro delas. Muitos reparadores se esquecem desse detalhe e o resultado é que o pedal do freio pode abaixar repentinamente comprometendo a segurança do condutor”, salienta o reparador David Henrique dos Santos Silva (foto 7), de 26 anos e há 14 no ramo, da Interceptor Auto Reparadora.

De forma abreviada, uma sangria, acompanhada de uma troca dos cilindros, pode, de acordo com os reparadores Éder Aparecido e David Henrique, ser sistematizada em cinco grandes blocos de trabalho, que são descritos a seguir:

1. Medição da acidez do fluido de freio

O reparador precisa ter, em sua oficina, um aparelho chamado Analisador do Fluido do Freio que testa o ponto de ebulição de todos os tipos de fluido, analisa sua umidade e seu grau de acidez. “Acusando um resultado acima de 2%, como no caso desse Corsa, onde se registrou 3% ou mais, o fluido está vencido, ou seja, deve ser trocado e é necessário fazer uma sangria”, explica David Henrique.

2. Desmontagem das rodas traseiras

Com o fluido vencido é grande a possibilidade de haver vazamento nos cilindros das rodas traseiras, com freio a tambor, que precisarão ser substituídos por novos. Com isso é também realizada uma rigorosa limpeza (foto 8) do interior do tambor para eliminação do pó que resulta do atrito da lona com a sapata do freio. Os rolamentos também são (foto 9) lubrificados com nova graxa, assim como suas pistas (foto 10). Outro procedimento a ser feito com cuidado é lixar a lona (foto 11) para retirar a sua vidração e a sujeira, deixando-a mais porosa. “A aspereza aumenta a aderência e a eficiência do freio”, explica o reparador David Henrique. Da mesma forma, deve-se lixar também o interior do tambor para retirar sua sujeira e o espelhamento (foto 12).

 

3. Substituição dos cilindros - Os cilindros devem ser trocados por peças de acordo com as especificações da montadora. Como os freios ABS são produzidos em alumínio uma tendência é que os novos cilindros também sejam produzidos com esse material e não mais em ferro, pois o alumínio evita a contaminação do sistema de freio por alguma oxidação produzida pelo ferro.

 

4. Sangria do fluido

Como todo reparador sabe o fluido do freio nunca deve ser completado e sim inteiramente trocado – aliás, essa é uma boa informação a ser passada aos clientes da oficina. Assim, a troca do fluido deve ser iniciada pela drenagem do fluido velho com um injetor (foto 14) ou uma bombinha caseira de sucção, para só depois ser colocado o novo fluido no reservatório. Para maior segurança, o reparador deverá ainda checar a qualidade do novo fluindo antes de repô-lo no reservatório, com o Analisador do Fluido do Freio (foto 15). Atenção: use sempre o fluido recomendado pela montadora. Com a chave ligada a ignição, um reparador começa a bombear o pedal do freio para forçar a saída do fluido velho, que é recolhido (foto 16) em uma garrafa pet ligada ao sangrador (válvula) das rodas traseiras. À medida em que o liquido recolhido começar a ficar claro (na cor rosada), a sangria nesse lado do veículo estará realizada. O processo deve ser iniciado pela roda mais distante do servofreio do motor, geralmente a traseira direita, e repetido na outra roda, pois só assim o fluido velho terá saído totalmente e a sangria estará completada.

5. Finalizando o processo

Por último, montam-se o tambor (foto 17) e a roda e, eventualmente, se o fluido estiver baixo no reservatório (foto 18) ele poderá ser completado com o novo líquido. O fluido velho (foto 19) deverá ser separado para reciclagem.