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Defeito na direção elétrica do Citroën exige cuidado do condutor e paciência do reparador


Localização vulnerável do módulo eletrônico da direção e extrema dificuldade em conseguir peça de reposição junto à montadora deixam veículo parado por dois meses em oficina mecânica. Viria recall por aí?

Por: Antônio Edson - 22 de maio de 2017

Ponha o leitor, em uma mesma conta de somar, as seguintes parcelas: ruas e estradas esburacadas e mal conservadas; um automóvel, ao que tudo indica, com um projeto não totalmente adaptado para essas condições de rodagem brasileiras; e uma crônica deficiência no fornecimento de peças devido a uma baixa demanda, questões logísticas ou a algum gargalo em sua produção – que a falta de transparência da montadora não permite enxergar qual é. O resultado provável é negativo em todos os sentidos: um automóvel parado por tempo indeterminado em uma oficina e à espera de uma única peça, um dono de automóvel frustrado e se sentindo lesado por ter investido uma grande quantia em um veículo que não faz o mínimo que se espera dele – rodar! – e um reparador angustiado e com a sensação de impotência por não conseguir resolver o problema de seu cliente. Trata-se, infelizmente, de uma situação que muitos reparadores já viveram em uma ou várias ocasiões e que, até o fechamento dessa matéria, em meados de abril, preocupava o administrador de empresas Walter Harada (foto 1), proprietário da RTR Autocenter, localizada no bairro da Saúde, em São Paulo (SP), e Consultor OB desta edição.

Tudo começou quando, em fevereiro, encostou na RTR um Citroën C4 Pallas modelo 2014 (foto 2) com um defeito em sua direção elétrica que a tornava dura e pesada e, portanto, até inviável e perigosa a condução do veículo. O diagnóstico indicou uma deficiência no módulo eletrônico (foto 3) da direção elétrica que, nesses modelos de veículo e em mais alguns outros da família Citroën, se situa na parte dianteira do cofre, mais precisamente pouco acima da roda direita (foto 4). Segundo relato do cliente, o veículo começou a apresentar essa falha após passar em um buraco coberto por água, ou seja, uma poça. De fato, uma análise mais detalhada apontou que, provavelmente, o módulo eletrônico entrou em contato com a água e ficou inoperante desde então. Diga-se que isso dificilmente ocorreria se, como acontece na maioria dos automóveis produzidos no País, esse módulo eletrônico da direção elétrica se situasse na parte superior e posterior do cofre, junto ao painel corta-fogo ou mesmo mais próximo à coluna da direção. “Não tenho dúvida que temos aí uma inadequação de projeto”, constata o Consultor OB Walter Harada.

 

Bola cantada

Diga-se a favor do veículo que nada aconteceria se ele trafegasse em condições de piso uniformes e lisas como os existentes em países da Europa e América do Norte. “Seria o melhor dos mundos se tivéssemos as mesmas condições de rodagem dos países desenvolvidos, mas isso, infelizmente, parece longe de acontecer aqui”, lamenta Walter Harada. Logo, ao menos por enquanto, cabe às montadoras adaptar seus veículos às condições brasileiras.  Em se tratando de Brasil e do Citroën C4 Pallas, por exemplo, a localização do módulo eletrônico da direção elétrica precisaria ser revista por estar mal localizada e vulnerável, podendo facilmente ser danificada e deixar de funcionar. “Caso contrário, esse deverá ser o primeiro de muitos problemas que poderão vir pela frente. Os reparadores precisam ficar de sobreaviso”, avalia o Consultor OB. E essa revisão, por parte da Citroën, não aconteceria pela primeira vez. Em 2010, o grupo PSA Peugeot-Citroën já convocou alguns proprietários dos modelos Citroën C4 hatch e C4 Pallas, ano/modelo 2009 e 2010, que apresentavam o mesmo problema – a direção demasiadamente dura e pesada – para uma “atualização do programa no módulo de controle”.

A inadequação da posição do motor elétrico da direção em alguns modelos da Citroën também já havia sido previamente apontada pelo Jornal Oficina Brasil em setembro de 2016, quando um produto da mesma montadora, o Citroën Aircross 1.6 Shine, foi conduzido aos reparadores para uma análise prévia. Na ocasião, dentro da seção Em breve na sua oficina, o reparador e empresário Warlen César Rodrigues, da Mult Injection, localizada no bairro da Penha em São Paulo (SP), havia “cantado a bola”. Embora houvesse destacado que o fato de a caixa da direção e seu motor elétrico estarem juntos apresentava uma vantagem pela proximidade, pois isso facilitava um diagnóstico reparativo, ele também chamou a atenção para uma desvantagem: ambos estavam localizados em “um ponto mais vulnerável do que se estivessem instalados na coluna de direção” (foto 5). “Outro modelo de veículo fabricado e comercializado no País que apresenta o módulo eletrônico da direção elétrica na mesma posição, e portanto muito propenso a apresentar problemas futuros, é o BMW 320i”, previne o reparador Walter Harada.

Foto 5

Muita paciência

De acordo com o consultor OB, um novo recall, seguido de uma revisão do projeto, podem ser as melhores soluções para prevenir futuros problemas. Uma outra solução, mais paliativa do que definitiva, segundo ele, seria a montadora ao menos dispor de modo imediato a peça problemática, o tal módulo eletrônico, a quem precisasse, mas isso também parece muito distante. “O problema da direção elétrica do Citroën C4 Pallas parado aqui poderia ser resolvido em, quando muito, uma ou duas horas de oficina, pois o procedimento é relativamente simples: o acesso ao módulo é tranquilo e se faz por baixo do carro (fotos 6, 7, 8 e 9), restando, depois, apenas, reprogramar o módulo”, explica o reparador Walter Harada.

Assim aconteceria, obviamente, se fosse possível fazer a uma rápida reposição da peça defeituosa, caso ela ao menos existisse em estoque junto ao seu fornecedor. “O problema é que também isso não tem ocorrido, ao menos por enquanto”, avisa o Consultor OB. Orçada, em março, em aproximadamente R$ 3,2 mil, ela, de fato, só pode ser encontrada, nova, junto à montadora que tem protelado a entrega do produto, abusando da paciência dos reparadores. No caso do veículo parado na oficina RTR Autocenter, por exemplo, a novela do pedido e da entrega da peça, por parte do departamento de peças do grupo PSA Peugeot-Citroën, se prolonga há quase dois meses. Solicitada em fevereiro, até o dia 17 de abril não havia sido entregue pela montadora. “Se o veículo estivesse em uma concessionária da marca estaria parado do mesmo jeito”, previne o Consultor OB.

Pedra no sapato

Esse problema da indisponibilidade de peças originais da Citroën – um dos fatores fundamentais para um produto ser bem aceito e mesmo recomendado – não chega a ser uma novidade. Ao contrário, há tempos tem sido uma pedra no sapato que incomoda muitos reparadores independentes que se queixam não apenas dos preços elevados das peças – como é o caso desse módulo da direção elétrica – como também da falta de uma política comercial adequada de muitas montadoras, não apenas da Citroën, junto as oficinas independentes. No caso especifico do grupo PSA Peugeot-Citroën, entretanto, o problema ganha contornos um pouco mais dramáticos e exige decisões urgentes. Mesmo porque a imagem do grupo está ameaçada. A última pesquisa “Imagem das Montadoras”, por exemplo, realizada pela Cinau (Central de Inteligência Automotiva) e publicada na edição de dezembro de 2015 do Jornal Oficina Brasil, indicou que as montadoras do Grupo PSA (Peugeot e Citroën) ocupavam uma incômoda posição e figuravam entre as menos indicadas pelos reparadores independentes.

Nesse cipoal de dificuldades para proprietários de veículos e reparadores independentes surge, no entanto, uma réstia de esperança. Recentemente, o grupo PSA Peugeot-Citroën tomou uma decisão que promete tornar mais ágil o atendimento à demanda de peças oriunda de suas concessionárias e das oficinas independentes. “A unidade que concentrava a distribuição de autopeças do grupo foi transferida de Barueri, na grande São Paulo (SP), para Porto Real (RJ), planta industrial que reúne a produção dos modelos das marcas Peugeot e Citroën comercializados no Brasil. Tomara que seja uma solução”, torce o Consultor Walter Harada. “Todos nós, hoje, principalmente no setor automobilístico e da reparação, operamos no sistema just on time, porque ninguém pode se dar ao luxo de ter em estoque uma peça como esse módulo eletrônico da direção elétrica, que custa mais de três mil reais, devido ao seu baixo giro. Como todos os outros reparadores independentes, fazemos pedidos diários às montadoras e distribuidoras de autopeças, na expectativa de sermos atendidos. E isso é o que também nossos clientes, que também são clientes das montadoras, esperam”, garante.