Neste mês continuarei o relato do diagnóstico do Corolla equipado com motor 7AFE, com dificuldades de partida e falhas de funcionamento.
Para que entrasse em funcionamento, o proprietário “injetava tensão” com uma caneta de polaridade e quando o veículo funcionava, o acelerador deveria ser acionado constantemente, pois o carro não conseguia estabilizar a marcha lenta.
Na edição passada, relatei os itens que foram trocados para teste e fiz uma breve descrição do funcionamento do sistema de ignição deste veículo. Hoje mostrarei o passo a passo do diagnóstico.
No diagnóstico de veículos que não entram em funcionamento, o primeiro passo é a verificação do “Pentágono da Combustão”.
O “Triângulo do fogo” e o “Pentágono da Combustão”. Pentágono da Combustão?
O termo pode parecer esquisito a princípio, mas já já você irá entender. O conceito de “triângulo do fogo” certamente é conhecido por todos da reparação automotiva.
O triângulo do fogo é a representação gráfica dos três elementos necessários para que haja uma combustão (queima).
Esses elementos são: o combustível, que fornece energia para a queima; o comburente, que é a substância que reage quimicamente com o combustível; e o calor, que é necessário para iniciar a reação entre combustível e comburente.
Combustível: É tudo que é suscetível de entrar em combustão (madeira, papel, pano, estopa, tinta, alguns metais, etc.)
Comburente: É associado quimicamente ao combustível, é capaz de fazê-lo entrar em combustão (o oxigênio é o principal comburente).
Energia de ativação ou ignição: É o calor necessário para que a reação inicie, após isso o próprio incêndio se torna a fonte de calor.
Sabemos que dentro da câmara de combustão do motor de ciclo Otto existe uma combustão: o comburente (ar atmosférico) entra pela válvula de admissão juntamente com o combustível e a vela de ignição fornece o calor necessário para queima. Entretanto o check destes três elementos não é suficiente para um diagnóstico de veículo que não entra em funcionamento: combustível, comburente e ignição são suficientes apenas para a formação da chama. No funcionamento do motor ciclo Otto teremos que acrescentar mais dois elementos.
A introdução do diagrama do “Pentágono da Combustão” representa as cinco arestas a serem verificadas pelo reparador automotivo:
• Combustível. Alguns carros não entram em funcionamento por falta de combustível, seja por defeito na bomba de gasolina, injetores ou chicote elétrico. Esta etapa é de fácil verificação. Se jogarmos combustível no TBI e o veículo entrar em funcionamento, a causa da falta de combustível deverá ser investigada
• Comburente: o ar na admissão. Filtro de ar do motor, mangueiras, juntas do coletor de admissão devem ser checados pelo reparador. A carbonização excessiva no coletor ou válvulas também atrapalha o fluxo de ar para o cilindro.
• Ignição. A mistura tem que inflamar. Um teste prático para o check do sistema de ignição é a instalação de um centelhador ou algo metálico como uma chave de fenda, no cabo de vela, e deixar muito próximo da massa do veículo. Quando o motor entrar em funcionamento, a faísca deverá saltar no milimétrico espaço da ferramenta à massa do veículo. Se não houver centelha, a causa deve ser investigada.
• Compressão. Entra em cena o quarto elemento da nossa figura geométrica. Se temos combustível para queimar e uma boa centelha, essa mistura deve ser comprimida para que ocorra uma boa explosão e possibilite o funcionamento do motor. Baixas compressões podem impedir o funcionamento do motor ou deixá-lo com pouco desempenho. Desgaste no motor, problemas nas válvulas ou sincronismo errado são as principais causas.
• Eletroeletrônica do veículo: a UCE pode bloquear a partida do motor por alguma estratégia de funcionamento ou mesmo o sistema de imobilizador pode interferir na partida. O diagnóstico deverá ser executado preferencialmente com um scanner automotivo e osciloscópio.
Estes são os cinco pilares a serem checados em veículos que não entram em funcionamento. Veja a aplicação do Pentágono da combustão no Corolla:
No Corolla em questão, existia combustível no tanque e este chegava nos injetores. Os injetores eram acionados corretamente e a qualidade do combustível também foi verificada. Com osciloscópio, capturamos um sinal característico.
Procurei no coletor de admissão algum problema de vedação ou carbonização. Nada de errado foi encontrado.
Quanto à ignição, foi verificada com centelhador a centelha, que saltava nos quatro cabos de vela. O osciloscópio mostrou um sinal característico do sistema.
Prosseguindo os testes agora na parte mecânica do motor, percebi uma pequena alteração na CR (compressão relativa) e ao checar o vácuo do coletor de admissão com uma fermenta específica, o TVA (transdutor de vácuo na admissão), encontramos um problema.
Nesta foto, temos o sinal de vácuo juntamente com sinal de fase (G1) que evidentemente mostra falha em pelo menos dois cilindros. Todavia seria essa a causa do motor 7AFE não entrar em funcionamento?
Havia uma falha mecânica no motor pelos testes de CR e TVA, isso era fato. Porém as alterações nos sinais eram poucas e conclui que o motor deveria pegar, mesmo falhando. Dei prosseguimento com os testes na parte eletroeletrônica do veículo.
Vai a dica:
O reparador pode ter esses cinco pilares em suas anotações pessoais para a elaboração de uma estratégia de diagnóstico nos veículos que chegam na oficina, observe a figura 3.
Chegou a hora de espetar o osciloscópio em sinais vitais para o funcionamento do motor: Sensor de rotação (letra A) e no sinal de primário de ignição (letra B), conforme mostra a figura 7.
Os pontos destacados com a letra “P” sinalizam o momento que o motor começa a girar. Sinais são gerados no Canal A e no círculo em Amarelo, vemos os primeiros pulsos de ignição. Logo em seguida vemos o motor entrando em funcionamento, destacado pelo retângulo amarelo.
A análise mostra que o distribuidor enviava um sinal de rotação para a UCE (unidade de controle eletrônico) e esta enviava os comandos de ignição e injeção. O próximo passo foi a captura do sinal de rotação (sinal NE conforme explicado na edição anterior) e o sinal de fase (G1).
No canal A temos o sinal de disparo da pinça indutiva no cilindro 1, no canal 2 o sinal de fase e no canal 3 temos o sinal de rotação. O círculo em Vermelho chama atenção para o formato da onda. Algo de errado estava acontecendo ali.
No manual técnico Toyota que encontramos no Google, havia a representação gráfica padrão do sinal de rotação e fase.
Fica evidente o contraste entre o sinal padrão do manual e o que encontramos no veículo, destacado em vermelho. O que estaria ocasionando a deformação da onda? Falha no sensor? Falha no eixo do distribuidor? Falha elétrica? Olhando atentamente para o sinal de rotação, parece que tínhamos o desenho da “cadeirinha” do sistema de ignição junto ao sinal de rotação. Desconfiamos de uma possível interferência eletromagnética, pois a bobina apresentava rachaduras e o corpo ferroso da bobina, o trafo, estava magnetizado. Sobre esse assunto de interferência eletromagnética e construção da bobina de ignição, minhas dúvidas foram sanadas nos canais de suporte técnico de duas empresas, para as quais deixo registradosmeus agradecimentos: Microcar e NGK. As informações colhidas foram fundamentais para o meu diagnóstico.
Chegou a hora de testar o chicote elétrico, pois certamente havia um curto. Mas onde? Numa inspeção visual do chicote, achamos dois pontos onde provavelmente haveria um curto: na parede corta-fogo do motor, onde havia atrito com uma mangueira e dentro do veículo, no chicote que passava próximo ao pedal do acelerador.
Realmente havia alguns fios com isolamento comprometidos. Efetuados os reparos e ao testar novamente o sinal do sensor de rotação, o sinal permanecia distorcido.
Procurando por curto-circuito do sinal de rotação quanto à massa, positivo e entre outros fios do distribuidor, abrimos o circuito do sensor de rotação próximo à parede corta-fogo. Esse procedimento mostraria onde estaria o curto: no cofre do motor ou dentro do veículo. O fio de sinal de rotação deveria ter resistência infinita com os sinais de controle do distribuidor de ignição, positivo e negativo. Porém havia uma resistência de cerca de 280 Ohms com um dos fios do distribuidor de ignição. Correndo o chicote de 6 pinos do distribuidor achamos a pane: um defeito colocado (o pior de todos!) dentro da tomada que encaixava no distribuidor. Algum reparador tentando recuperar a tomada, soldando os fios, deixou que um pouco de estanho escorresse para dentro da tomada.
Após reparo no conector, veículo entrou em funcionamento normalmente e manteve uma marcha lenta estável. Uma análise detalhada nos pinos do distribuidor após o reparo, encontramos respectivamente os sinais de: rotação (NE), fase (G1), acionamento do módulo de potência (IGT) e o sinal IGF. Veículo foi liberado com a observação da pane no cabeçote.