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Montadoras sob a mira da reparação


Afinal, quem é o cliente das fabricantes de automóveis? Quem compra carro novo ou aquele que possui um veículo da marca?

Por: Alexandre Akashi - 09 de fevereiro de 2011

Afinal, quem é o cliente das fabricantes de automóveis? Quem compra carro novo ou aquele que possui um veículo da marca? Somente aqueles que fazem manutenção na rede oficial? E quem opta pela manutenção na rede independente de oficinas? Segundo estatísticas, a montadora que opta pela primeira opção considera apenas cerca de 20% dos donos de carros efetivamente clientes...

Nesta décima edição da pesquisa Imagem das Montadoras/Melhor Carro, realizada pela CINAU (Central de Inteligência Automotiva), unidade de negócios de pesquisas do Grupo Germinal, a Fiat confirmou a segunda colocação como marca de maior prestígio entre os reparadores automotivos, conquistada na edição anterior. Assim, está atrás apenas da General Motors, que há sete anos é líder absoluta na preferência dos profissionais da reparação.

Já a Volkswagen, que no ano passado havia despencado para a quarta posição, esboça agora uma tímida recuperação, ao conquistar o terceiro lugar, com pouquíssima margem de vantagem sobre a Toyota, quarta indicada pela pesquisa, que nos meses de novembro e dezembro de 2010 ouviu 1.169 reparadores de todo o país, via internet e por carta.

Outra alteração que vale destaque é a ascensão da Renault, que subiu uma posição e agora ocupa a colocação que era da Peugeot. Honda, Citroën e Ford não apresentaram alterações no quadro, e permanecem em quinto, sexto e último lugar, respectivamente.

AFINAL, O QUE QUEREM OS REPARADORES?

Parafraseando a minissérie da TV Globo, a resposta a esta pergunta é bem mais simples do que a busca do herói da TV, que tentava entender o universo feminino. Para o reparador, carro bom é aquele que ele consegue consertar, de forma rápida, pois ele lida com o pior dos mundos: a insatisfação do dono do carro.

Assim, tudo o que querem é informação técnica e peças de reposição de qualidade, a preço justo. Estas são as matérias-primas do reparador. O advento da injeção eletrônica mostrou que os reparadores têm competência para aprender a lidar com as inovações tecnológicas, e o aumento cada vez mais frequente de dispositivos eletrônicos nos veículos passará a ser simplesmente mais motivos para eles se aperfeiçoarem tecnicamente.

Porém, para que isso ocorra, é preciso que as montadoras disponibilizem as informações ao mercado, pois erra quem pensa que a rede concessionária tem condições de atender toda a frota de veículos circulante.

Não é preciso ser muito esperto para fazer esta conta. Nos últimos três anos, a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) tem divulgado quebra de recorde de vendas consecutivos, o que significa mais e mais carros nas ruas. Porém, a rede de concessionárias não cresce proporcionalmente.

Neste ponto, volto a lembrar da entrevista do presidente da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores), Sérgio Reze, no jornal Folha de S.Paulo, de 10 de novembro de 2010, em que ele afirmou que as concessionárias têm capacidade de atendimento de 25% a 30% dos carros que representam.

Assim, está mais do que claro que não faz mais sentido esta reserva de informação técnica. E, sendo assim, aqui vai outra pergunta: quem é o cliente da montadora? Quem compra o carro ou aquele que possui o carro da marca?

MAL NECESSÁRIO?

Pode parecer loucura, mas é de se pensar que pós-vendas é, para as montadoras, um mal necessário. O mundo perfeito seria o de carros que não quebram, não precisam de manutenção, são, enfim, descartáveis.

Algumas indústrias já chegaram a este ponto, como a de eletrodomésticos. O liquidificador quebrou? Joga fora e compra um novo...  é mais prático e sai mais barato do que mandar consertar. Quem sabe as fabricantes de automóveis não chegam a este ponto um dia?

Mas, enquanto esse tempo não chega, como fica o consumidor, o dono do carro? Ele é cliente enquanto está na concessionária, adquirindo um veículo novo, mas, e depois? A mesma reportagem do jornal Folha de S.Paulo acima citada revelou que 17% dos donos de carro ainda em garantia não têm conseguido agendar a primeira revisão na concessionária, perdendo assim a garantia do veículo. Para onde vai este consumidor?

Para a oficina independente! Mas, como será feita a manutenção do veículo se a informação técnica está em poder única e exclusivamente das montadoras e sua rede? Vender muitos carros é muito bom, porém, é preciso lembrar que o automóvel ainda não é um bem descartável.

Algumas montadoras já entenderam isso, parcialmente, e buscam aproximação com o reparador independente, como a Fiat, por exemplo. A marca, que na primeira edição da pesquisa CINAU Imagem das Montadoras, realizada em 2000, foi considerada a pior de todas, principalmente porque os carros apresentavam grande dificuldade de manutenção. Nos últimos anos, a marca trabalhou o pós-vendas e mudou o conceito dos reparadores, e hoje figura na segunda colocação entre as mais recomendadas. Veja o quadro com a avaliação das marcas.

GM, Fiat, Volkswagen, Ford, Toyota, Honda, Peugeot, Renault e Citroën são as montadoras com maior expressão no volume de vendas do mercado interno e, por isso, faremos a seguir uma análise de desempenho de cada uma delas.

Nenhuma marca é perfeita. Todas possuem prós (virtudes) e contras (pecados) na avaliação dos reparadores. A CINAU identifica anualmente quais são as virtudes e os pecados mais importantes para os mecânicos, criando assim um padrão. A partir deste padrão, compara com o resultado individual de cada montadora.

O fato de uma montadora ter índice negativo significa, portanto, que comete mais pecados do que virtudes. É preciso, no entanto, levar em consideração o volume da frota circulante para cada montadora, pois menos carros significa que o reparador teve menor acesso à marca, e menores chances de experiências positivas e negativas. Mais carros na frota traz assim nitidez ao resultado, em relação à percepção do reparador.

GM
A General Motors do Brasil conquistou a liderança na edição 2003/2004 da pesquisa CINAU Imagem das Montadoras, com 31,2% da preferência dos reparadores e não saiu mais desta posição. Porém, depois de atingir o pico em 2007, com 48,5%, vem apresentando índices cada vez menores. Em 2009 já havia perdido quase dois pontos em relação à pesquisa anterior, e nesta última, perdeu mais 1,4 ponto percentual, fechando com 24,2%.


A GM está em meio a um processo de reformulação da linha de produtos. Segundo a montadora, no ano que vem, 100% da linha será renovada, em outras palavras, adeus velhas plataformas, velhos motores. Isso vai ser bom para a imagem da empresa junto ao consumidor, porém o reparador terá muito o que reaprender.

Em entrevista ao jornal Oficina Brasil, publicada na edição de janeiro, a diretora de pós-vendas, Isela Constantini, mostrou ser uma pessoa bem antenada com o mercado de reposição e reparação e, portanto, deverá iniciar um trabalho de aproximação com a categoria, para que os novos produtos não causem complicações aos reparadores. É esperar para ver.

FIAT
A montadora de origem italiana confirmou a segunda posição alcançada na edição passada quando desbancou a Volkswagen. Fechou 2010 com 12,4% da preferência dos reparadores e só não foi melhor porque ainda restam algumas lembranças do passado recente de modelos como Tipo e Marea, que puxam o índice para baixo.


Em 2010, investiu em novos modelos e, principalmente, na atualização da motorização dos veículos existentes, uma vez que a parceria com a GM acabou. Os novos motores E.torQ ainda são um mistério para a maioria dos reparadores, porém a marca tem como benefício um excelente trabalho de relacionamento com os reparadores e, com certeza, não vai deixar a peteca cair neste momento.

VOLKSWAGEN
Se na pesquisa anterior a Volkswagen despencou do segundo para a quarta colocação, nesta edição recuperou uma, e fechou 2010 na terceira posição, com 10,4% da preferência do reparador.


A VW foi a marca com maior índice de aprovação da história da pesquisa CINAU. Em 2000, no ano da estreia, obteve impressionantes 60,8 pontos. A perda da liderança ocorreu em 2003/2004, para a GM; em 2005, ficou em terceiro também, mas voltou para segundo lugar nas edições de 2006, 2007 e 2008.

A marca apostou muitas fichas no novo Gol e Voyage, porém tem um trabalho ainda tímido de pós-vendas. Desempenho ruim dos carros e falta de qualidade foram as principais respostas dos reparadores em crítica à marca. Ainda assim, muitos ainda confiam na marca, o que é muito bom. Fato é que a VW quer se aproximar do reparador e pode aproveitar esta recuperação para marcar pontos com os profissionais da reparação.

TOYOTA
A Toyota voltou para a quarta posição após figurar no terceiro lugar, na edição passada, quando obteve 8,2% de recomendação. Nesta edição, foram 7,8%, um diferença pequena, o que significa que a marca não fez absolutamente nada para melhorar, mesmo depois do mega-anúncio de recall.


A ideia que os reparadores têm da marca é de veículos duráveis e de qualidade, o que não é mentira, porém a falta de informações técnicas e pouca disponibilidade de peças prejudicam o trabalho na oficina.

Este é um problema de cultura, pois tradicionalmente, as montadoras japonesas são bastante fechadas quando o assunto é relacionamento com aftermarket.

HONDA
O conceito da Honda junto aos profissionais da reparação caiu bastante nesta última edição da pesquisa. Despencou de 6,3% para 3,8%, o que dá margem para a seguinte interpretação: acabou o namoro.


Os novos Honda Fit não conseguiram superar os antigos. Estão mais difíceis de fazer manutenção, principalmente em São Paulo por causa da inspeção veicular ambiental. Aliado a isso, a dificuldade de acesso a informação técnica tem deixado muito reparador de cabelo em pé quando chega um carro desses na oficina.

Pode ser que para o ano que vem esse quadro mude um pouco, pois a Prefeitura de São Paulo fez algumas mudanças nos procedimentos de inspeção o que vai facilitar a vida dos reparadores. O grande problema do carro é a demora para baixar os índices de emissões de CO e HC em marcha lenta. 30 segundos não são suficientes. Com a nova norma, haverá carência de mais 30 segundos, caso os valores não caiam nos 30 primeiros (veja nota na página 78).

CITROEN
A montadora francesa que tem como slogan ‘Tecnologia Criativa’ melhorou alguns pontos em relação à pesquisa anterior, subiu de -7% para -5,9% na recomendação dos reparadores.


Fato é que neste último ano, pouco fez tanto em relação ao mercado de reposição quanto no lançamento de novos veículos. A única novidade em 2010 foi o AirCross, derivativo do C3.

As principais reclamações são dificuldade de acesso a informações técnicas, disponibilidade de peças insuficientes e dificuldade de manutenção. Somente as três mais importantes, na ordem.

A favor, o reparador confirma a qualidade e a relação custo x benefício dos modelos da marca. Isso, porém, é pouco para o profissional da reparação recomendar o carro ao cliente, pois sabe que depois, quando chegar a hora da manutenção, o trabalho será maior que a recompensa.

RENAULT
Na montadora francesa com maior representatividade no mercado 2010 foi um bom ano, pois subiu uma posição, e ficou à frente da Peugeot, pela primeira vez. Se na pesquisa anterior tinha -10,5% de recomendação, nesta tem -7,1%. Um feito e tanto.


O que os reparadores mais reclamam são de disponibilidade de peças insatisfatória, acesso precário a informação técnica, difícil manutenção e desconfiança da marca, nesta ordem.

Porém, é uma marca que conquistou parte dos reparadores pela simpatia e qualidade. Pena que simpatia é a última virtude na escala de valores dos reparadores.

PEUGEOT
A queda da Peugeot para a oitava posição foi uma surpresa, porém fácil de explicar. Mais carros nas ruas (a marca cresceu no Brasil), e muitos ainda continuam com velhos defeitos, que já deveriam ter sido sanados.


A vantagem da Peugeot sobre as demais francesas é a abertura de canal de relacionamento, ao menos com as redações da mídia especializada, graças ao bom trabalho desenvolvido pela assessoria de imprensa da montadora, que não nega o fornecimento de informações técnicas aos jornalistas. Assim, sempre que houver qualquer dificuldade em relação aos modelos, contem conosco que faremos o possível para ajudar.

Na pesquisa, os reparadores apontaram apenas três virtudes: confiança na marca, qualidade e relação custo x benefício. Já em relação aos pecados, predominam os três mais importantes: acesso precário a informações técnicas, disponibilidade de peças insatisfatória e difícil manutenção.

FORD
Como sempre, a Ford aparece na lanterna, na última posição entre as nove principais montadoras instaladas no País, com índice de -16,2%. Tem mais contras do que prós, na opinião dos reparadores e, por isso, é a menos recomendada por eles aos clientes.


Esta não parece ser uma preocupação da Ford, e dá margem para um questionamento: para eles, quem é o cliente? Quem compra carro zero km e utiliza os serviços da rede concessionária, ou quem tem um veículo da marca, independente de onde realiza manutenção?

Da Ford, os reparadores reclamam da falta de itens básicos (disponibilidade de peças insuficiente e acesso precário à informação técnica), apresentada por montadoras mais recentes no País, como as francesas e japonesas. De certa forma, toda a tradição da marca no País resume-se na venda de veículos, em volume limitado.

A seu favor, os reparadores mostram forte confiança na marca e, mesmo com índice de -16,2%, é possível dizer que houve uma melhora significativa em relação à pesquisa anterior. Na edição passada, o índice foi de -26,2%.

REFLEXÃO
Nesta edição mostramos a opinião do reparador em relação às montadoras. No mês que vem, traremos o estudo CINAU Melhor Carro, que identifica os modelos preferidos e detestados pelos profissionais de mecânica automotiva.

Mas antes, uma pequena reflexão. Se a montadora considera o dono do carro da marca um cliente – independente de onde ele faz a manutenção do veículo – vale lembrar a afirmação do gerente de Marketing Pós-Vendas, Peças e Acessórios da Fiat Automóveis, Armando Carvalho, que em entrevista a este jornal, publicada na edição de novembro do ano passado, disse: “Um pós-venda bem trabalhado é também uma pré-venda”.

Não seria lógico, então, uma aproximação com o reparador independente, que afinal é responsável pela manutenção de quase 80% da frota da montadora? Nesta lógica, o reparador, motivado em relação à marca, faria a melhor pré-venda. Pois é esta lógica que esta pesquisa evidencia: as marcas estão sendo “vendidas” pela recomendação do mecânico e as que estão perdendo vendas pela falta de prestígio junto aos profissionais. Tal realidade ficará ainda mais evidente quando analisarmos os resultados por modelo na próxima edição.

DNA – Estudo de Virtudes e Pecados da CINAU
O estudo de Virtudes e Pecados elaborado pela CINAU indica os pontos fortes e fracos das montadoras sob a ótica do reparador.  São 11 virtudes e 11 pecados classificados por ordem de importância. Quanto mais citações, mais importante é o quesito.

As virtudes são, em ordem de importância, a Confiança na Marca, Qualidade, Durabilidade, Acesso a Informação Técnica, Tecnologia, Disponibilidade de Peças, Relação Custo x Benefício, Facilidade de Manutenção, Mecânica, Desempenho do Carro e Simpatia com a Marca.

Os pecados, também por ordem de importância, são Acesso Precário a Informação Técnica, Disponibilidade de Peças Insatisfatória, Dificuldade de Manutenção, Desconfiança na Marca, Antipatia da Marca, Desempenho do Carro Insatisfatório, Relação Custo x Benefício, Pouca Qualidade, Durabilidade Insuficiente, Mecânica e Tecnologia Defasada.