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Dupla personalidade: tecnologia francesa promove conforto e segurança, mas também gera prejuízos


O carro avaliado para esta edição é o PEUGEOT 307 SW 2.0 16v, evolução do modelo 306. Esse veículo é dotado de alta tecnologia, mas também provoca muita dor de cabeça aos reparadores quando deixa de funcionar da forma prevista

Por: Carlos Júnior e Tenório Júnior - 14 de julho de 2015

Versão SW do Peugeot 307 2.0 16V é avaliado de formas distintas pelos reparadores independentesDesenvolvido pela empresa PSA Peugeot Citroën – líder no registro de patentes na França pelo sexto ano consecutivo – o sistema “MODO ECO” tem a finalidade de preservar a carga de energia disponível, e entra em funcionamento sempre que ocorre algum problema na parte elétrica do veículo. 

Esta função é polêmica junto aos proprietários e reparadores, e nessa matéria vamos esclarecer alguns equívocos de interpretação do funcionamento do “MODO ECO”.

Para elucidar esse tema e outros tópicos relevantes sobre o modelo, contamos com a experiência de 15 anos do reparador Reginaldo da Silva Carvalho, 32 (mais conhecido como Régis), que trabalha na Auto Elétrica e Mecânica JF; e do especialista em veículos franceses Luiz Fernando Alexandre da Silva, 28. Trabalha na oficina Tecnofrance há 9 anos, mas já possui 13 de experiência no ramo.

Régis, da Auto Elétrica e Mecânica JF / Luiz Fernando, da Tecnofrance

Em alguns modelos, como por exemplo, no Peugeot 206 1.0 16v 2001, quando o sistema entra em funcionamento, o módulo de injeção (ECU) bloqueia o pulso dos bicos, impedindo o motor de funcionar. Nesse caso, somente com a intervenção de um aparelho de diagnóstico apropriado para efetuar o desbloqueio do sistema. Esse é o grande terror dos reparadores, porque o simples fato de remover a bateria para um reparo na parte mecânica, como a troca da embreagem, faz com que o sistema entre em “MODO ECO”. Ou se durante um reparo qualquer, a luz interna ou o rádio ficar ligado, a tensão da bateria irá cair, e lá vem o tal “MODO ECO” atormentar a vida do reparador... E assim, se pintou o bicho de sete cabeças.

Mas, nem tudo está perdido! Pois, a mesma mente que cria o “bicho”, é capaz de adestrá-lo. Nos modelos 307, o nosso “bicho” foi domado! Agora, ele não bloqueia mais o módulo, apenas desabilita os consumidores elétricos. Dessa forma, se houver carga suficiente para funcionar o motor, em poucos minutos com o motor em funcionamento, após a bateria se reestabelecer, os componentes elétricos voltam a funcionar normalmente e a mensagem que perturba a todos, “MODO ECO”, sai de cena. “Porém, se a carga da bateria não for suficiente para funcionar o motor, nem com reza ele irá pegar”, afirma o especialista Fernando. Mas a culpa não é do “bicho”, é que o sistema de injeção necessita de carga mínima para funcionar, normalmente 9V. Se for esse o caso, basta recarregar a bateria ou trocá-la, que o carro voltará a funcionar.

Entretanto, quando há algum outro defeito como bomba de combustível avariada ou bobina da chave de ignição rompida, que impedem o motor de funcionar; a insistência nas tentativas de partida provoca naturalmente a queda de tensão da bateria, e adivinha o que vai acontecer...? Entra em ação o “MODO ECO”. Aí o reparador “escaldado” pelos antigos sistemas atribui o problema ao “bicho”, quando na verdade basta eliminar o problema, ou seja, identificar a peça avariada, substituí-la, e recarregar a bateria que o motor volta a funcionar e o “bicho” volta a hibernar.

“O MODO ECO ou sistema de economia de energia, vem tirando o sono dos reparadores”, diz o reparador Régis, que atende os modelos 307 com certa frequência. Segundo ele, o problema mais comum que leva o sistema a ativar o “MODO ECO”, é a bateria com baixo desempenho, com defeito de isolamento dos polos – tanto na parte externa que são os terminais e cabos, quanto na parte interna da própria bateria. 

Regis pontua a falta de resposta da montadora quando solicitada para esclarecer algumas dúvidas de funcionamento do sistema e ressalta: “há vários relatos sobre o mesmo problema, na internet, tanto de reparadores quanto de proprietários”.

Módulo BSI fica alojado do lado esquerdo do cofre do motorBSI

Mudando um pouco de assunto, vamos falar de outro item “problemático”, o BSI (Built-in Systems Interface ou interface de sistema integrado), normalmente chamados de caixa de serviço inteligente ou cérebro eletrônico do veículo.

O BSI controla os componentes elétricos e eletrônicos e muitas vezes apresenta falha no acionamento do motor de partida e buzina. Normalmente não é possível fazer o reparo do mesmo, e há necessidade de substituir a peça inteira. E aí começa o problema, pois o valor dessa peça nova é algo fora da realidade, e nem sempre o cliente tem possibilidade de comprar a peça genuína. Por não existir a peça nova “paralela”, a única saída é recorrer às oficinas especializadas em reparação de módulos, para tentar restaurar a peça defeituosa. Segundo Régis, nem sempre o conserto fica bom da primeira vez. “Outro dia surgiu um modelo idêntico com problemas na partida, e o mesmo BSI foi reparado por duas vezes e em pouco tempo de uso voltou a apresentar o mesmo problema. Não se sabe ao certo o que foi feito para reparar, mas por falta de outro recurso, o BSI pode ter sido reparado com a substituição de algum componente eletrônico, ou utilizado o famoso “gato”, ou seja, reconstrução (emenda) do circuito impresso da placa”.

INJEÇÃO ELETRÔNICA

Corpo de borboleta motorizadoNa injeção eletrônica (Magneti Marelli IAW48P2) o vilão é o corpo de borboleta motorizado. A falha deste componente ou do sensor do pedal do acelerador pode causar a perda da aceleração; estas peças mesmo novas apresentam baixa durabilidade e sua substituição é bastante complicada. Após a troca, é necessário efetuar o ajuste através do aparelho de diagnóstico, relata Régis.

Outros defeitos recorrentes nesse modelo são a falha prematura da bobina de ignição e o sensor de rotação que apresenta falhas com motor quente. Regis relata que a ECU perde dados da memória EPROM. Nesse caso há a necessidade de reprogramar o sistema com aparelho específico, que nem todos os reparadores possuem.

Motor 2.0 16V gasolina entrega potência de 143 CV a 6.000rpm e torque de 20 kgfm a 4.000 rpm

MOTOR

Para enriquecer essa matéria, tivemos a sorte de encontrar um Peugeot 307 2.0 16v ano 2007 de propriedade do técnico que nos auxilia nessa empreitada, o Fernando. O seu carro apresentou um defeito que, segundo ele, é bastante comum nesses veículos, trata-se de uma falha nas saídas, retomadas (conhecidas como “buraco ou vazio” na aceleração), e marcha lenta irregular. O especialista Fernando, que já trabalha com veículos franceses há 9 anos, relata o problema do seu carro: “Esse problema ficava mais perceptível na fase fria, depois de aquecido melhorava bastante, mas ainda dava um “vazio” nas saídas - é um defeito comum desse modelo”. Segundo ele, o problema se dá por carbonização na câmara de combustão, ou seja, na cabeça dos pistões, válvulas e cabeçote.

Bloco com os pistões carbonizados

Para sanar esse defeito, o ideal é remover o cabeçote para efetuar a limpeza das válvulas, coletor de admissão, cabeçote, cabeça dos pistões e corpo de borboleta, afirma Fernando. Ele lembra ainda, que não se pode esquecer de trocar óleo, filtros e as velas se estiverem carbonizadas ou desgastadas. Após efetuar os devidos reparos, “tem que fazer a programação da borboleta porque ela perde os parâmetros”, orienta o especialista, Fernando.

Os motivos que causam essa carbonização são: 

• Uso frequente em congestionamentos (motor trabalha muito tempo em baixas rotações);

• Utilização constante de combustível sem aditivo e/ou de má qualidade;

• Falha no sistema de injeção, ignição e/ou alimentação (provoca má queima de combustível, propiciando o acúmulo dos resíduos de carvão).

Vista superior do cabeçote com o duplo comando / Vista inferior do cabeçote com as 16 válvulas

Para evitar ou pelo menos minimizar esse tipo de problema, deve ser utilizada a gasolina aditivada, pois o aditivo presente no combustível atua como um “detergente”, além de limpar o que está sujo, impede a formação de depósito de carvão. Trocar o óleo no tempo adequado também ajuda!

DICAS DE OURO

O técnico Fernando orienta sobre outros defeitos comuns que deixam os reparadores loucos! 

Dica 1 - “Muitos mecânicos trocam a sonda lambda, bomba de combustível, sensor MAF e o defeito continua”

Sintoma: luz de anomalia acesa, motor não passa de 2000 rpm, marcha lenta irregular e acusa mistura rica, no aparelho de diagnóstico.

Teste prático: retirar a mangueira de recirculação de gases que vai na tampa de válvulas e vedá-la. Funcione o carro, acelere algumas e observe, se ficar “redondo”, o mistério foi desvendado.

Defeito: diafragma da válvula EGR que fica dentro da tampa de válvulas.

Solução: trocar a tampa de válvulas.

Tampa de válvulas

Dica 2 – Solenoide de pressão de óleo do cabeçote

Segundo Fernando, “a válvula tem a função de regular a pressão do óleo nos comandos e na polia, que é variável. De acordo com a necessidade de potência, em baixa rotação, ela libera mais pressão para o comando, adianta um pouco a polia e aí tem um desempenho maior em baixas rotações”. Quando ela está avariada, perde a estanqueidade, ou seja, ao desligar o motor, ela não consegue manter o óleo na linha de pressão, retornando para o cárter.

Sintoma: barulho de batidas de válvulas logo que liga o motor, após horas desligado. Depois que esquenta um pouco, o barulho some.

Solução: substituição da válvula solenoide.

Possível causa: muita sujeira no óleo / carbonização no motor.

Solenoide de pressão de óleo do cabeçote / Polia variável

CÂMBIO

Nos modelos equipados com câmbio automático modelo AL4 a dor de cabeça aumenta com os constantes defeitos nas válvulas solenoides ou sensor de posição da marcha, e o custo final chega a atingir os R$ 8.000,00. A remoção deste componente não é complicada.

FREIOS

Régis descreve que o sistema de freios, a partir dos 20.000 km, começa a apresentar falhas na parte de fixação dos cabos dos sensores de velocidade de roda do sistema ABS, deixando-os vulneráveis a impactos causados por objetos projetados pelos pneus.

Já o reparador Fernando menciona a folga no pino da pinça como defeito recorrente. Porém, afirma que para esse pino já existe original para a reposição.

Pinça de freio completa / Pinos da pinça

Outro componente importante do sistema de freio é o sensor do ABS, localizado na parte interna da roda, e faz a leitura de velocidade no rolamento de roda. É preciso prestar atenção na hora de trocar o rolamento, pois se colocar do lado errado, o sensor não faz a leitura, deixando a luz do ABS (no painel) acesa e o sistema anti-bloqueio deixa de atuar.

Sensor do freio ABS / Localização do módulo ABS

A localização do módulo ABS o deixa muito vulnerável. Fica atrás do para-choque dianteiro no lado direito e muito próximo ao solo. Em períodos de chuvas apresenta bastante oxidação nos terminais do chicote, tornando a manutenção bastante complexa, pois este componente divide espaço com o reservatório do lavador do para-brisa.

SUSPENSÃO

De acordo com o experiente técnico Régis, os problemas recorrentes são: batentes dos amortecedores, pivôs, bieletas e buchas de bandejas - “A suspensão desse carro é macia, mas não é muito durável. E tem mais, se não colocar peças originais, o problema volta em pouco tempo”, arremata com propriedade o reparador Fernando.

Vista dos componentes da suspensão traseira / Detalhes dos componentes da suspensão

SISTEMA DE ARREFECIMENTO

Carcaça com a válvula termostáticaO técnico Régis destaca como item mais reclamado, a válvula termostática. Segundo ele, a durabilidade é baixa, pois a mesma apresenta corrosão e consequentemente a falha no funcionamento causa superaquecimento do motor.

SUPORTE TÉCNICO

Nessa questão os técnicos concordam, é muito difícil encontrar informações técnicas sobre esse modelo, porque a concessionária não fornece. “Quando se tem um amigo que trabalha dentro da concessionária, é possível ter acesso à informação, caso contrário, só recorrendo aos manuais técnicos que são vendidos a preço de ouro, pelas empresas que os desenvolvem”, diz indignado o técnico Fernando.

“Se comparar com a VW, FIAT e Chevrolet, percebe-se facilmente que as informações técnicas dos veículos Peugeot, são mais difíceis de encontrar; quando precisamos, temos que recorrer ao Sindirepa SP ou oficinas parceiras (Fórum por exemplo)”, exclama Régis.

FERRAMENTAS ESPECIAIS

Para manutenção do motor e suspensão existem diversas marcas e modelos de ferramentas, mas o que deixa a desejar é o scanner para um correto diagnóstico da parte eletrônica, pois às vezes para uma melhor produtividade, a oficina precisa manter mais de um modelo, pois dificilmente um único scanner possui todos os recursos necessários, mas em contrapartida, as atualizações pesam bastante nos custos do reparador.

PEÇAS NO MERCADO

Esse é outro ponto em que os reparadores se alinham. Segundo Fernando, a maioria das peças originais só é possível encontrar na concessionária, sendo que para os itens de menor giro ou preço elevado, há a necessidade de encomendar, podendo demorar de 3 a 5 dias úteis. E as peças compradas no mercado independente de reposição, na maioria das vezes, não possuem durabilidade satisfatória, o que compromete e muito a qualidade dos serviços prestados. Infelizmente o proprietário do veículo não vai atribuir o defeito prematuro à qualidade da peça, mas sim ao reparador. Esta situação evidencia a responsabilidade do reparador na escolha de seus fornecedores, pois cabe a ele decidir a marca da peça e o fornecedor mais adequado para satisfazer o cliente, evitando retrabalhos e executando os serviços dentro de um orçamento compatível com o perfil do proprietário do veículo.

 Para Régis, a disponibilidade de peças paralelas no mercado é bastante atraente e consegue utilizar 70% da fatia deste mercado, porém alguns componentes somente podem ser substituídos por outros comprados na concessionária (genuínos). A boa notícia é que atualmente os preços nas autorizadas apresentaram queda, por exemplo, o corpo de borboleta, que custava aproximadamente R$ 1.000,00 hoje pode ser encontrado por R$ 400,00.

REPARABILIDADE

Fernando não vê grandes dificuldades para executar os reparos desse modelo, e claro, por ser especialista em marcas francesas, valoriza o cliente Peugeot pois estes geram serviços atrativos e rentáveis.

Régis considera que tecnicamente não há grandes dificuldades para executar os reparos nestes veículos; exceto se o scanner não estiver atualizado. Todavia, pela fragilidade de muitos componentes e os constantes problemas eletrônicos, somados com o questionável modo ECO que acaba atrasando a execução de alguns procedimentos de reparo, ele prefere atender veículos de outras marcas, nos quais a relação com o cliente acaba sendo mais tranquila. De um modo geral, os acessos aos principais itens de manutenção são bem amplos e de fácil intervenção.

Lembrando que os reparadores ouvidos são especialistas na marca, porém esta visão não é compartilhada com a maioria dos profissionais conforme aponta a pequisa IMAGEM DAS MONTADORAS.

Nenhuma dificuldade para troca de filtros, velas, correias e manutenções básicas / Filtro de óleo e motor de partida com fácil acesso por baixo